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25 de Abril Para Quem?

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Há cinquenta e um anos, a mais importante revolução em Portugal tomou lugar. Foi no dia 25 de Abril de 1974 que o povo decidiu não cumprir com as ordens militares, decidiu sair às ruas, preenchê-las por completo, com cânticos, cores, celebrações e alegria. Toda a repressão fascista parecia ter acabado, e só havia motivos para celebrar.

Já passado mais de meio século desde então, são celebrados os 51 anos do 25 de Abril em Lisboa, uma celebração com donos e com tentativas de ser controlada.

O EDR formou bloco com o Coletivo Ruptura, levando uma faixa onde estava pintado “Nem fascismo, Nem democracia burguesa, Todo o poder ao proletariado”. Para além disso, várias bandeiras vermelhas compunham o bloco que bem se diferenciava de todos os outros, a grande maioria dos quais cantavam os típicos gritos inofensivos do “25 de Abril sempre, fascismo nunca mais”.

Relativamente perto do local de concentração, rotunda do Marquês, meliantes fascistas começavam ações violentas, com pouca oposição, contra militantes antifascistas que se mobilizaram para travar uma convocação neo-nazi, claramente provocatória, no Martim Moniz. Na hora de realmente fazer frente a uma ameaça real, presente a poucos metros da grande manifestação do 25 de Abril, a organização nada fez. Os cânticos puramente performistas estavam ainda longe, e como é óbvio, não impediram as ações violentas dos nazistas de prosseguirem. Face a estes acontecimentos, o entretanto candidato à presidência da república António Filipe faz algumas declarações preocupantes na CNN¹, já depois do ocorrido. Começa por dizer que eram apenas “meia dúzia” de fascistas, que o povo não se revê nestes movimentos e que não devem ser levados a sério. Algo estranho de se dizer nos dias de hoje. Enquanto o fascismo cresce por toda a Europa e pelo Mundo, enquanto movimentos nazistas saem à rua sem medo e sem represálias, incitam o ódio e a violência, uma das figuras mais relevantes do PCP vem nos dizer que são poucos, não devem ser levados a sério e até que o fascismo se combate no desfile do 25 de Abril, e não pela forma que os militantes antifascistas fizeram. Não nos esquecemos: de Alcindo Monteiro, assassinado por neonazistas, Bruno Candé, assassinado por motivos de ódio racial, as bárbaras agressões a Cláudia Simões pela polícia, o assassinato de Odair Moniz, também às mãos da polícia, a intimidação institucional com a polícia a encostar à parede centenas de imigrantes. A violência contra as pessoas queer e a estigmatização da pessoa queer, cada vez mais normalizada pelo crescimento do movimento fascista. A institucionalização e normalização da maior opressão a grupos marginalizados é cada vez maior, e não vem só de partidos mais declaradamente fascistas, mas também dos de “centro” e “democráticos”. Não bastando, António Filipe anunciou também que os manifestantes antifascistas cometeram um erro ao protestar contra os nazis. Ou seja, numa zona onde se concentram pessoas imigrantes, mais vulneráveis aos ataques tanto físicos como de ódio, efetuados pelos grupos nazistas que ali se manifestaram, a conclusão é que é um erro fazer uma mobilização para a tentar contrariar.

A posição de António Filipe, de que não se deve dar atenção ou levar os fascistas a sério, é uma posição mais geral da sociedade burguesa, que historicamente ignorava o problema fascista, ou o combatia apenas de forma simbólica. Mas essa posição tem um grande problema. O Fascismo necessita deste espaço e esta falta de notoriedade para se constituir, para aumentar os seus números e a sua organização, planear e levar a cabo atos violentos, apanhando normalmente as vítimas de surpresa, gerando reações de “como é que isto aconteceu no Portugal de abril?”. Eventualmente chega-se a um ponto em que a democracia burguesa, deixando o fascismo crescer sem restrições, vê-se forçada, por medo de represálias ou insurreição, a cooperar com o fascismo (como acontece hoje), ou ser derrubada pelo mesmo.

Não podemos ser contra o antifascismo, mas também não nos achá-lo resposta suficiente. Essa luta tem mostrado historicamente os seus grandes limites e defeitos, já que a classe dominante nunca terá problema de mostrar as suas garras mais afiadas, por muito “democrática” que ela seja. A luta contra o fascismo só se faz na luta contra o capitalismo, uma luta concreta contra os moldes de exploração burguesa. Caso contrário, o fascismo irá sempre cá estar. Não consideramos que nos caiba condenar quem se organiza e arrisca para fazer frente ao “protesto” da escumalha nazista. Criticando a limitação essencial do movimento antifascista enquanto reação frentista ao movimento fascista, vemos como inaceitáveis as condenações de António Filipe aos manifestantes antifa.

Voltando ao desfile principal. A marcha ia começando a descer a Avenida da Liberdade, e o nosso bloco aguardava para entrar. À nossa frente, estavam 4 pessoas da organização, fardadas à medida, todas de igual, com um colete vermelho da CGTP. Já nos conheciam e estavam claramente incomodados com a nossa presença. Depois de realmente terem reparado em quem nós éramos, começaram com inquietações defensoras. Não eram apenas 4 pessoas da organização, eram 4 militantes, já há algum tempo, do PCP. A nós disseram que “O Partido já cá anda há 104 anos!”, “Onde está o vosso trabalho de fábrica?” “Por que tapam a cara? Estão a ocultar-se do quê?”. O nosso bloco ficou na defensiva, mas do outro lado chegaram até a chamar a polícia, dizendo que nós éramos um coletivo agressivo e que não estávamos a respeitar a ordem do desfile. Como se não bastasse, o tom passou rapidamente de defesa a intimidação, com insultos à mistura, onde a diferença de idades era clara: do nosso lado jovens comunistas, do outro, pessoas resmungonas de meia idade. O tempo passava e era claro que já havia mais que oportunidade para os blocos passarem. Atrás de nós, estava o bloco conjunto do TU com o Em Luta, que também começaram a ficar cansados de tanto esperar. Em contestação, a camarada Renata Cambra veio tentar entender o motivo de tanta espera, e pressionou a organização a deixar-nos passar. O outro lado estava claramente relutante a isso. No meio de exaltações, até nos tentaram arrancar a faixa. Como estava claro que a malta da organização não lá estava pelos interesses da manifestação, e sim pelos interesses do Partido em abafar a nossa presença, o bloco tentou passar pelos controleiros do PCP. Estes tentaram bloquear não só o nosso bloco, como também o bloco do TU/Em Luta, com um pequeno e mísero cordão humano e com encontrões e empurrões à mistura.

A passagem foi feita, e o bloco lá marchou na Avenida, não tendo causado nenhum constrangimento no resto da marcha. Os constrangimentos só surgiram do outro lado. Lá de trás, veio uma carrinha branca, com dois megafones no tejadilho, abafar os nossos cânticos, de notar que não foi algo feito pela primeira vez. Mesmo assim, as nossas vozes foram mais altas. E até saudamos e valorizamos algumas participações conjuntas em alguns cânticos pontuais entre os blocos do EDR/Ruptura e TU/Em Luta, demonstrando algum sentido de unidade, ainda que pouco.

As perturbações controleiras não surgem apenas do nosso bloco. Do bloco transativista da Opus Diversidades, surgem relatos que remetem mesmo à tentativa de censura na manifestação. Ao EDR, chegaram os seguintes testemunhos: “Presenciei uma pessoa que circulava ao lado direito da carrinha branca a mandar outres se calarem e pararem com o uso dos megafones, com a justificação que já tinham uma "carrinha e prejudicava o som" eu própria passei pela situação ao fim de diversas utilizações quando disse a frase "o corpo não binário é revolucionário", vi várias pessoas incomodadas com situações similares, e testemunhos parecidos, 25 de abril é de todes, a voz não pertence singularmente a nenhum grupo, demonstraram uma posição autoritária e hostil que em nada está vinculada com a celebração da liberdade.”; “Eu simplesmente estava de tudo, eu e mais algumas pessoas, enquanto cantávamos e estávamos a celebrar abril (e tudo o que ainda é preciso continuar de), e do nada só vemos a faixa a cair no chão e um homem quase a querer rasgar. Obviamente que ficamos perdides, não sabíamos o que estava a acontecer, e estávamos até com medo que poderia mesmo acabar em agressões físicas. Depois com a polícia que obviamente também não ia com a nossa cara, ficava ainda pior.”

Ficam claras as tentativas de controlo de um momento que não é de todo exclusivo ao PCP. O 25 de Abril e o PREC tiveram uma grande participação de organizações e Partidos que já na altura denunciavam o seu caráter revisionista e traidor do proletariado.

Aprendemos nesta manifestação que as tentativas de silenciamento e intimidação não acontecem apenas internamente. São expostas para o resto do movimento comunista real, realizado à esquerda do PCP, e este não o tolera. Mas a cada dia que passa, a crise estrutural do capitalismo agudiza, o fascismo cresce, o ecocídio aumenta, e torna-se maior a quantidade de comunistas que se apercebem do verdadeiro carácter do PCP, e estes, juntam-se para reconstruir a organização revolucionária do proletariado. Nós, Em Defesa da Revolução, lutamos pela reorganização do movimento Comunista, pela reconstrução do Partido Comunista em Portugal, por um movimento livre de opressões, que é verdadeiramente contra qualquer forma de racismo, sexismo, xenofobia e queerfobia. Reconhecemos que o PCP trai o Movimento Comunista, algo repetidamente denunciado no passado, evidente também nesta Marcha do 25 de Abril. Queremos lutar lado a lado com outros comunistas, não só em Portugal como em todo o Mundo. Juntes, avançamos e construímos o nosso futuro, livre da opressão, descriminação e exploração, pela realização dos nossos objetivos: a reconstrução do Partido Comunista, a Revolução Comunista Mundial, rumo à Vitória Final!

1 - CNN

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